Bacharel de Direito, estudante de Teologia, pós graduanda de Direito, escritora, empresária e blogueira. Quase mulher, quase gente, quase anjo, quase santa. Apaixonada por nuvens e mar. Nem muito doce e nem tanto amarga. Feita de carne, osso, pele, cor e poema.

23 de abril de 2016

Mulheres do lar

Há alguns anos atrás quando dava entrada nos papéis de casamento no fórum, a servidora indagou algumas informações para dispor no documento do casório. Animados, até então apaixonados e decididos sobre o nosso futuro respondíamos sem titubear sobre os dados questionados, exceto quando a pergunta foi sobre a nossa ocupação. Ele, todo pomposo relatou a sua atividade principal ($$), enquanto na minha vez fui interrompida sem direito a replica: “ela é do lar”.

Confesso que senti a carne cortando quando ele deu essa afirmativa, primeiro porque não apenas tinha ocupação, como havia planos muitos maiores que eram sucumbidos, e em seguida percebi o papel que deveria exercer.

Ao visualizar a reportagem no estilo de Revista Caras como se fosse uma coluna social, porém dentro da Revista Veja, me senti dentro de um casamento que não suportou 45 dias e que precisei abandonar o barco antes que ele afundasse por completo.

Simone de Beauvoir uma filosofa intelectual afirmou: “que a liberdade seja a nossa própria substância”, e isso cheira ao século que estamos inseridos. Por favor, não confundam as bolas, a mulher pode ser sim quem ela quiser, ela só não pode ser obrigada a agir de forma diversa como gostaria.

Relembro que para não contrariar o quase futuro marido permaneci calada, ele não gostava de ser contestado, tampouco aborrecido em público. Dormi com a frase “ela é do lar” e acordei com ela ressoando em minha cabeça. Não custou para tirar o carro da garagem, ir até o fórum e pedir alteração colocando a minha real ocupação.  A servidora riu do acontecido, rimos juntas. Talvez aquele riso tivesse uma ironia em relação a minha péssima escolha do pretendente.

O meu entojo e o espanto da maioria sobre a reportagem seja, justamente, pelo fato de não sermos educadas para cozinhar, lavar e passar. Somos doutrinadas a ter um bom currículo, falar fluentemente duas línguas e sermos livres para escolher onde pousar. Felicidade e submissão não são palavras que se entrelaçam. Não para mim. Felicidade rima com liberdade e com serenidade.


Somos capazes de odiar uma batedeira de presente de aniversário, ou um jogo de panelas antiaderente. Mas somos capazes de amar ilimitadamente aquele que sabe caminhar junto de mãos dadas, seja no lar, seja na rua, na chuva ou numa casinha de sapê.

Juliana Soledade

Crônica produzida para o Jornal A Região publicado no dia 23 de Abril de 2016

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