No final da década de 80
Papai tinha bigodes horríveis (e eu tinha certeza que ele roçava na barriga de
minha mãe), eu nasci tendo que encarar esse rosto mimoso com um tufo imenso
abaixo do nariz, ainda quando pequena ele insistia em aparar e manter aquela
poluição facial, hoje rimos da modinha e das fotos épicas.
Painho sempre foi esbelto e
distante, fala mais com os olhos e o corpo do que com a boca. Painho tem
rodeios, mas também tem braços que acolhem e carinhos que acalentam. Ele sabe
quando é hora ficar, sobretudo a hora de partir.
Eu invadi a sua vida sem pedir licença por duas vezes, a primeira foi no meu nascimento, a segunda
no seu renascimento, uma pessoa-amor que me olhou com os dois olhos e com um
coração que não tem tamanho de tão grande. Painho deu-me sobrenome referência,
e uma família apaixonante. Painho me oferece os pés no chão a cada bate-papo e
a confiança de voar em outras órbitas. Ele escuta Caetano Veloso enquanto eu me
viro às avessas com Chico Buarque.
Poderia listar que somos tão
parecidos como tanta gente diz, mas na verdade somos o elo com um acerte
interessante. Esse paralelo é óbvio apenas porque aprendemos a caminhar no
mesmo passo e compasso sem nunca ter levantado as guardas, ou ter declarado
guerra.
Engana-se quem pensa que é
preciso ter bases sólidas para desempenhar tão bem este personagem, ele, sem
pai até no registro, soube desenvolver com maestria, alçado na escola da vida,
entre pedras e tropeços, chegando ao auge com a catequização inicial da própria
neta que tem como uma filha.
Eu nunca aprendi a confiar
em meu pai. Eu nasci confiando, quando pequena eu chegava em casa arrebentada e
ele cuidava dos machucados, depois do banho pedia que ele enxugasse as feridas.
Depois de grande ele repetiu nos tantos cortes cirúrgicos, e soube cuidar
melhor do que qualquer enfermeiro graduado, Bob como é chamado, tem delicadeza.
A confiança apenas dilatou com o passar dos anos. Quem diria que seriamos
sócios-amigos-cúmplices-parceiros de jornada? Bem, ninguém diria.
A delicadeza da vida se
revela quando ele sabe fazer o papel ofertado, compartilhando afetos e
referências, vibrando junto-com e alimentando sentimentos. Ele mostrou que pode
ser pai, e me ensinou a ter a fortaleza de um pai. Mas eu acho mesmo que meu coração
já batia por ele desde quando eu nadava na barriga de minha mãe.
Meu pai me
ensinou - e ensina - que "A história fala dos heróis, a história fala dos
vilões; a história só não fala dos omissos”. Eu tento aprender as lições nas
entrelinhas.
Do alto, apenas gratidão! E
um desejo de que o exercício da paternidade seja todos os dias a todos os pais.
Categorias:
Agosto,
Amor,
Itabuna,
Pai,
publicação